Quanto pesa o voto evangélico? - Agenda Assembleiana

Quanto pesa o voto evangélico?

O peso do voto evangélico voltou a ser um dos temas centrais da campanha eleitoral para a presidência da República. No final de semana que passou a mídia deu destaque à arrancada meteórica da ex-senadora Marina Silva e a repercussão de seus posicionamentos sobre temas morais sensíveis, devido ao fato da candidata ser evangélica e membro da Igreja Assembleia de Deus do Distrito Federal.

O tema, todos nós sabemos, não é novo. Nas eleições de 2010 o chamado “voto evangélico”, o peso da religião e de questões de natureza moral sobre a esfera pública brasileira revelaram-se de forma clara. Para se ter um ideia, a atual presidente petista, Dilma Roussef, durante a campanha daquele pleito visitou igrejas e lançou no início da propaganda eleitoral um documento chamado “Carta Aberta ao Povo de Deus”, no qual, além de reconhecer, vejam só vocês, a importância do trabalho das igrejas de confissão evangélica na sociedade brasileira, assumia o compromisso de deixar para o Congresso Nacional “a função básica de encontrar o ponto de equilíbrio nas posições que envolvem valores éticos e fundamentais, muitas vezes contraditórios, como o aborto, formação familiar, uniões estáveis e outros temas relevantes tanto para as minorias como para a sociedade brasileira”.

O nível da discussão neste processo eleitoral, porém, ao que parece, deve ser mais contundente. A presença de dois presidenciáveis ligados à maior denominação evangélica do país, especialmente a candidata Marina Silva, ante as pesquisas favoráveis que apontam boas chances de vitória em um hipotético segundo turno, elevaram o tom do debate a outro nível, recebendo análises as mais diversas.

A revista Veja destacou que os evangélicos representam 22% dos brasileiros. “E essa faixa do eleitorado tende a um alinhamento natural à candidatura de Marina. Prova disso foi que sua entrada na corrida presidencial desidratou justamente o candidato oficial das igrejas, que leva o "pastor" no nome: Pastor Everaldo, do Partido Social Cristão, o PSC.

A matéria ainda ressaltou que “os evangélicos também têm forte presença no Congresso Nacional, em comparação aos católicos, religião da maioria dos brasileiros. Nos meios de comunicação, a busca dos pastores começou nos anos 1980 como uma forma de conquistar concessões de rádio e televisão. Atualmente, o Congresso possui 73 deputados e senadores evangélicos – a meta para este ano é que o número chegue a cem cadeiras. Desde 1986, a cada pleito, o número de parlamentares cresce 20%. Neste ano, a bancada evangélica emplacou o primeiro representante no Executivo: o bispo Marcelo Crivella (PRB), sobrinho de Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) – ele deixou o cargo de ministro da Pesca para concorrer ao governo do Rio de Janeiro”

Nada obstante, Veja fez questão de pontuar que, apesar da crescente representatividade política, é difícil esperar que os 22,2% da população brasileira que se declara evangélica irá votar em bloco em um determinado candidato.

Enquanto isso a revista Época trouxe como matéria de capa o pomposo título: O poder do voto evangélico, na qual afirma que com o crescimento de Marina Silva nas pesquisas, os analistas têm avaliado continuamente o que chamam de “voto evangélico”. Muitos estudiosos acreditem que não existe esse tipo de classificação, preferindo classifica-lo de “voto conservador”, pois muitas dessas questões são defendidas igualmente por católicos praticantes.

A revista esquerdista Carta Capital publicou artigo de Ricardo Alexandre sob o título “Afinal, quem são os evangélicos”. Nele o autor afirma: “Dizer que “o voto dos evangélicos decidirá a eleição” é tão estúpido quanto dizer a obviedade de que 22,2% dos brasileiros decidirão a eleição”.

Tais fragmentos deixam transparecer o debate fervoroso em torno da influência da religião evangélica no processo político-eleitoral. Nessa discussão, os pontos de vista vão do messianismo religioso à negação do chamado “voto evangélico”. De um lado, há quem diga que nós, os evangélicos, decidiremos a eleição presidencial deste ano. Do outro, aqueles que refutam a existência de tal voto, em face da pluralidade evangélica no país e a improvável votação em bloco.

Suponho que a fragilidade de alguns pontos de vista sobre o assunto tenha sua origem no entendimento equivocado do real sentido da expressão “peso do voto evangélico”. Talvez devêssemos, antes de nos lançarmos à discussão, definir logo de início o que se entende por “peso” e por “voto evangélico”. É impossível levar qualquer diálogo adiante quando os interlocutores dão significados diferenciados ao mesmo termo.

Comecemos pelo “voto evangélico”. Tal expressão não significa, em primeiro lugar, pensamento unificado dos evangélicos do país, a indicar que os crentes votarão de maneira idêntica em um mesmo grupo de candidatos, seja por conta de uma linha de valores e princípios morais extraídos da Bíblia, seja por indução de líderes religiosos.

Assim como existe uma linha teológica evangélica conservadora, que defende um Estado mais enxuto e com menos programas sociais populistas, há também a linha teologicamente liberal e politicamente socialista.

Da mesma forma que existem evangélicos que seguem à risca a indicação dos candidatos dos seus pastores, há quem mantenha a sua autonomia de pensamento para o exercício do voto livre e consciente.

Do mesmo modo que existem aqueles que argumentam em prol de uma teocracia evangélica, existem também aqueles que defendem o completo afastamento dos cristãos do mundo político-eleitoral.

Enfim, há evangélicos e evangélicos.

Entender que o todo evangélico é ignorante, subserviente e politicamente alienado é a clara demonstração de preconceito e completo desconhecimento desse grupo social.

Logo, não há falar-se em “voto evangélico” no sentido de votação coletiva em determinado candidato ou programada de governo. Há, por outro lado, “voto evangélico” se considerado como a efetivação de um grupo de eleitores que advém da mesma confissão religiosa, mas que podem expressar doutrinas e pontos de vista completamente opostos. E ainda que tais conflitos existam, continua sendo “voto evangélico”, afinal, é exatamente a confrontação de perspectivas de temas morais sensíveis, como o aborto e o casamento homossexual, que realçam a presença evangélica no cenário eleitoral. Nenhum outro grupo social debate esse assunto com tanta ênfase quanto esse.

Agora, pensemos no “peso” do voto evangélico. Peso significa importância e influência. Quanto a isso, qualquer pessoa sensata há de concordar que hoje os evangélicos, apesar da diversidade doutrinária, influenciam o processo eleitoral, tanto no direcionamento dos debates públicos, quanto no resultado das eleições.

A influência na agenda dos candidatos e nos debates públicos é algo patente. E quanto ao resultado da eleição, qual a comprovação de tal influência? Embora não seja possível quantificar o impacto direto no resultado dos pleitos, as últimas eleições presidenciais e a atual campanha em curso sugerem a influência crescente da religião evangélica nas disputas eleitorais.

Lembremos que em 2002 o então candidato evangélico Antony Garotinho conseguiu a expressiva votação com quase 18% dos votos, e em 2010 Marina Silva conquistou 19,33% da votação para Presidente da República. Entretanto, somente em 2014 é que o voto evangélico parece que decidirá de fato uma eleição.

Estima-se que atualmente os evangélicos representem entre 25 e 30% da população do país e, embora não haja um pensamento dominante, vários fatores combinados do cenário político nacional, como o descontentamento com o governo petista, o enfraquecimento do principal representante da oposição, Aécio Neves, e o crescimento da candidata Marina Silva, parecem apontar para a influência decisiva dos eleitores evangélicos neste pleito de 2014, especialmente para a disputa do cargo de presidência da República.

Negar o peso do voto evangélico nesta eleição equivale a negar uma realidade social, ante a crescente e cada vez mais marcante presença dos evangélicos no ambiente político. Entretanto, isso não significa a defesa do messianismo religioso na vida política do país, numa espécie de teocracia evangélica.

É uma simples constatação sociopolítica.

O peso do voto evangélico não deve ser o peso do voto de “cajado” ou o peso da massa de manobra. O peso do voto evangélico é o peso do voto democrático, livre e consciente, que espelha os princípios e valores de um dado grupo social, sem desrespeitar o direito à liberdade de crença e de consciência de cada indivíduo.

Valmir Nascimento
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